segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Chega um tempo...


Chega um tempo em que a gente tem de fazer uma pausa na vida, repensar o trabalho, as relações afetivas, refazer os pensamentos. Enfim, a roda-viva quando está prestes a nos engolir, a nos triturar em sua engrenagem nos faz pedir um tempo. É hora de pedir pra sair. Sair de onde pra onde? Quando estamos nos sentindo devorados ou perdidos em nossa faina diária, ou mesmo ensimesmados em nosso mundinho essencialmente particular, faz-se necessária uma guinada, uma mudança significativa, seja ela qual for. 


Quando me sinto assim, um pouco enfadada ou tristonha ou solitária, o surto que me acomete é estético. No intuito de sair da mesmice, quase sempre entro no primeiro salão de cabeleireiro que me aparece e peço que cortem o meu cabelo. E esse desejo me vem assim, de chofre. E geralmente o estrago acontece, pois o que me vem num átimo não deixa de ser uma determinação, uma grande vontade de mudar. Por mais incrível que possa parecer, ao me olhar no espelho e me sentir mais feinha, é como se um peso me saísse dos ombros. É como se a purgação me aliviasse das atitudes equivocadas que me tornaram uma mulher meio acabrunhada, meio de mal com a vida. 


Depois da atitude intempestiva, passo a pensar no que realmente precisa. Revejo as decisões tomadas, repenso as palavras proferidas, um monte de outras coisas e, aos pouquinhos, vou percebendo que estou de volta, mais feliz e revigorada. Não sei se o mesmo acontece com muita gente, e como isso se dá. Só sei que o mundo anda de ponta-cabeça e que as pessoas andam pirando. A piração vem sob diversas formas: desde a grosseria absurda dos motoristas no trânsito, como o mau humor predominante nas repartições públicas em relação às pessoas atendidas,ou quando entramos numa fila de um caixa qualquer. 


A maioria anda estressada, com muita pressa. E a má educação que, não raramente vira violência,anda em alta. Sou muito atenta ao comportamento humano.Sempre me chamaram a atenção as várias maneiras como homens, mulheres, crianças e jovens se portam nas situações mais prosaicas. E me incluo também nas minha próprias observações. 


Assim, quando estou perto de alguém que perdeu o controle e mandou alguém à...., me pergunto: E se fosse comigo? Como eu agiria? Tenho aprendido a aplicar na minha vida a empatia e posso garantir que tem dado certo. Dificilmente vou às vias de fato, ou enveredo pelo caminho da baixaria (sem nenhuma intenção de me isentar dos meus tropeços).


Mas, de volta ao início desse artigo, chega um tempo que a gente vai recuperando nossa essência diluída no caos moderno, na orgia capitalista que nos esmigalha feito rolo compressor, fazendo a nossa coisificação ou, para ser mais explícita, nossa desumanização.Então o nosso alarme natural apita: Pausa para reflexão! Ah, se não atendemos a essa ordem, pobre de nós! 


É claro que a poluição na qual vivemos já comprometeu muitos de nossos sentidos, atrofiou alguns, corrompeu outros mas, se pelo menos um dos cinco conhecidos ( temos tantos outros ainda desconhecidos) estiver preservado, vamos parar e refletir sobre nossas ações. O espírito de sobrevivência é demasiadamente forte para tentar sobrepujar as forças que nos minam e nos consomem.


Então chega um tempo que vamos nos irmanando em nossa pequenez, vamos nos assemelhando em nossas limitações, vamos nos percebendo no outro e, consequentemente, vamos nos reconhecendo como mulheres, homens, jovens , idosos, com suas singularidades e semelhanças. Enfim, vamos recuperando nossa humanidade.


Aí, aos poucos, o meu descontrole emocional que me fez cortar o cabelo intempestivamente, ou o surto da vizinha que acabou por agredir o marido, ou mesmo o caixa do supermercado que atendeu tão mal o cliente e tantas outras mazelas diárias vão dando lugar a atitudes mais assertivas. Mas se, somente se , a gente aprender a decodificar os sinais que nos fazem dar um tempo em nossas pequenas (grandes?) insanidades.


Chega um tempo....
amariliatc
Publicado no Recanto das Letras em 01/02/2011

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